O Supremo Tribunal Federal (STF) poderá julgar, nos próximos meses, se a Receita Federal pode compartilhar dados bancários e fiscais de contribuintes com o Ministério Público (MP) sem autorização judicial. Esse tema foi incluído na pauta de julgamento do segundo semestre do Plenário da Corte — divulgada no fim de semana pelo presidente, o ministro Dias Toffoli — e é um dos mais esperados pelos advogados.
Na pauta também constam ações de ordem tributária com impacto relevante ao mercado. Os ministros devem decidir em outubro, por exemplo, se a Receita pode cancelar, sumariamente, o registro das empresas de cigarro no caso de não pagamento de impostos e contribuições.
Já para o mês de novembro está prevista análise sobre a inclusão do salário-maternidade no cálculo da contribuição previdenciária. Esse caso somente tem impacto de R$ 1,2 bilhão por ano aos cofres públicos, segundo a Fazenda Nacional. “É a primeira vez que essa questão entra no calendário e a discussão é se esses valores têm ou não natureza de remuneração”, diz Leonardo Augusto Andrade, do Velloza Advogados. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já decidiu sobre esse tema, em repetitivo, e entendeu que deve compor a base da contribuição patronal. “O STF, agora, vai dar a palavra final do ponto de vista constitucional.”
Há ainda a previsão para o julgamento de processos que estavam na pauta do primeiro semestre e acabaram não sendo analisados. Dentre eles, a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no 4905, prevista para o dia 21 de novembro. Os ministros vão tratar da multa de 50% que é cobrada dos contribuintes nos casos de indeferimento dos pedidos de compensação (uso de crédito para pagar tributo).
“Essa multa existe porque o pedido tem efeito imediato para o contribuinte. Ele consegue extinguir o débito com o crédito que afirma ter direito já quando apresenta o pedido. Serve, então, para evitar que sejam prestadas informações erradas à Receita Federal”, diz a coordenadora da atuação da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) no STF, Alexandra Carneiro. “Mas não sabemos se será realmente julgado. Esse processo entra e sai de pauta desde 2016.”
O julgamento, desta vez, vai depender do processo que envolve o compartilhamento de dados obtidos pela Receita Federal com o Ministério Público (RE 1055941). Ambos os casos estão pautados para o mesmo dia — 21 de novembro — só que este consta como o primeiro da pauta. E a discussão deve ser longa, observam advogados, já que a decisão que será tomada pelos ministros poderá impactar operações como Zelotes e Lava-Jato.
Isso porque, segundo advogados, a Receita teria se comunicado com o MP por meios não previstos em lei. “O meio legal é a representação fiscal para fins penais. Mas existem casos em que houve troca de ofícios. A Receita atuou, por vezes, como um braço de fiscalização do Ministério Público”, diz uma fonte. “Se não tiver decisão judicial autorizando, as provas poderão ser anuladas se o Supremo assim decidir”, complementa.
Esta será a primeira vez que o plenário discutirá sobre o assunto. Há uma decisão recente da 2a Turma (RE 1144128). Os ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Celso de Mello derrubaram uma decisão monocrática do ministro Edson Fachin que permitia o compartilhamento de dados sem autorização judicial.
A pauta do Supremo tem sido divulgada com antecedência desde que o ministro Dias Toffoli assumiu a presidência. Ele já havia liberado a pauta de todo o semestre no começo do ano. Antes, o que se via, segundo advogados que acompanham os julgamentos na Corte, eram divulgações semanais.
Em comparação com o primeiro semestre, nota-se um aumento na indicação de temas tributários, observa Eduardo Lourenço, sócio do Maneira Advogados. Ele cita três casos importantes envolvendo Estados e municípios. Todos tratam da base de cálculo de taxas que foram criadas ao longo dos anos.
Um deles envolve o município de São Paulo (ARE 906203). Os ministros vão analisar, no dia 5 de setembro, lei que estabelece taxa de fiscalização cobrada das empresas que estão instaladas na capital paulista.
Um outro caso envolve o Estado do Pará, que criou uma taxa de controle, acompanhamento e fiscalização das atividades de exploração e aproveitamento de recursos hídricos (ADI 5374). Será julgada ainda a taxa de controle, monitoramento e fiscalização ambiental cobrada pelo Estado do Rio de Janeiro de empresas de energia (ADI 5489). Ambas estão na pauta de 11 de setembro.
Para Francisco Giardina, do Bichara Advogados, esses julgamentos são importantes porque haverá a possibilidade de o tribunal “reavaliar a questão da métrica” das taxas. “A cobrada no Estado do Pará, por exemplo, tem como base o volume de água que circula na usina. Esse critério não tem relação nenhuma com o de fiscalização.”
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