Uma das questões mais debatidas em operações de fusões e aquisições (M&A) é o preço de compra. O vendedor, com a ajuda de assessores financeiros, faz a avaliação do seu negócio (valuation) com base em números do passado e em projeções futuras de desempenho. A tendência do comprador, por sua vez e de forma natural, é questionar os números apresentados, principalmente no que tange ao futuro da empresa-alvo. Como forma de alinhar essa dicotomia de interesses entre as partes, a prática norte-americana criou um mecanismo de ajuste de preço chamado earn out.
De forma ampla, o earn out é a parte do preço de aquisição a ser pago pelo comprador ao vendedor caso a empresa adquirida, após implementada a aquisição, atinja determinadas métricas de desempenho futuro. Ela visa dar um maior conforto ao comprador de que as expectativas apresentadas pelo vendedor a respeito dos resultados futuros da companhia, e utilizadas como uma das premissas para a definição do preço de aquisição, sejam concretas.
A métrica mais comum é a fixação de um valor mínimo de EBITDA (earnings before interests, taxes, depreciation, and amortization) que a empresa deve atingir dentro de um determinado período de tempo (usualmente entre 3 a 5 anos, conforme caso).
Contudo, o earn out apresenta uma série de questões por vezes complexas de serem negociadas e suficientemente endereçadas pelas partes.
Primeiramente, como o período de earn out transcorre após a aquisição e, portanto, quando o comprador já é o novo dono do negócio, há sempre um grande receio por parte do vendedor de quais mudanças administrativas e financeiras serão implementadas pelo comprador depois do fechamento da transação. Por
exemplo, a utilização de um novo software de gestão mais custoso que o anteriormente utilizado pelo vendedor ou a necessidade de contratação de novos profissionais que agregarão mais custos administrativos. Esses e outros temas afetam diretamente o EBITDA e, consequentemente, tornam mais dificultoso atingir as metas definidas contratualmente.
Em segundo lugar, nem sempre o vendedor continua na gestão do negócio após o fechamento da transação. Logo, o comprador deverá estruturar uma nova equipe administrativa que, em alguns casos, não irá performar tão bem quanto o vendedor, o qual, na maioria dos casos, possui vasto conhecimento do negócio transacionado.
A grande questão é conseguir equalizar os interesses antagônicos das partes quanto à forma de gestão futura do negócio: por um lado, o comprador não quer ter amarras na forma de condução da operação, eis que o negócio passou a ser de sua propriedade. De outro lado, o vendedor não quer correr o risco de perder parte relevante do preço de venda em decorrência de inabilidade, custos de integração ou, porque não, de má-fé do comprador.
Em alguns casos, são negociados ajustes ao conceito contábil clássico de EBITDA, de forma que alguns atos praticados pelo comprador após o fechamento não sejam computados para fins de cálculo. Os itens que compõem o ajuste irão variar de caso a caso, pois dependem muito as características de cada negócio e
partes envolvidas. Outra possibilidade pouco utilizada é a fixação de outra métrica menos sujeita a impactos gerenciais, tal como a receita líquida.
Em suma, faz parte do dia a dia dos assessores financeiros e jurídicos das partes o desafio de estruturar e negociar os termos e condições do earn out da maneira que mais atenda aos interesses das partes envolvidas e tentando regular contratualmente o máximo possível de hipóteses de forma a reduzir o risco de um litígio futuro.
Fonte: Lippert Advogados