A Lei Nº 14.611/2023 e a sua importância para garantir um mercado de trabalho equânime

Bichara Advogados para Análise Editorial

Por Christiana Fontenelle

Os movimentos para que a mulher possa marcar o seu espaço de fato e de direito no mercado de trabalho é antigo e anterior à própria Consolidação das Leis do Trabalho (“CLT”). Ao longo dos séculos e, ainda hoje, a voz da trabalhadora tem que ser alta e clara para que a sua luta por igualdade de direitos ecoe no mercado de trabalho e lhe proporcione segurança, oportunidades e visibilidade.

Recentemente duas novas Leis amplificaram esta voz ao criar deveres para os empregadores com o fim de garantir não só que o mercado seja mais inclusivo e atento à mulher, mas também que o ambiente de trabalho se faça equânime e seguro.

A primeira Lei é a de número 14.457/2022, em vigor desde setembro de 2022, que instituiu o Programa Emprega + Mulheres e trouxe importantes alterações à CLT destinadas à inserção e manutenção da mulher no mercado de trabalho, como as medidas a serem adotadas para a prevenção e combate ao assédio sexual e outras formas de violência do âmbito do trabalho, atribuindo novas competências à CIPA, órgão que passou a ser denominado Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e de Assédio.

No último dia 04 de julho foi publicada a Lei número 14.611, a qual dispõe sobre tema não menos significativo, qual seja, a igualdade salarial e de critérios remuneratórios entre homens e mulheres. A fim de ressaltar a urgência do assunto basta nos atermos aos dados da última pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (“IBGE“), a qual constatou que a diferença de remuneração entre homens e mulheres voltou a subir, chegando a 22% no fim de 2022. Ou seja, uma mulher recebe, em média, 78% da remuneração de um homem.

Não fosse só isso, as mulheres ocupam um número bem menor de cargos de gestão e o desemprego as atinge com maior força.

Neste cenário, inegável a expressividade desta Lei e a importância com a qual deve ser tratada pelo empregador, na medida em que terá que adotar uma série de cuidados e medidas para atender às suas determinações e ao desejo da sociedade e do mercado por um ambiente de trabalho mais igualitário e cuidadoso com o tema.

Realmente, como vem se discutindo, a Lei não altera o caput do artigo 461 da CLT, o qual já determinava que sendo idêntica a função, ao trabalho de igual valor exercido no mesmo estabelecimento e para um único empregador, deve ser garantida a mesma remuneração, independente do gênero do profissional que o exerce, sua etnia ou idade.

A Constituição Federal de 1988, por sua vez, por meio do inciso XXX do artigo 7º, proíbe a diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil.

Assim, vê-se que a inovação legal não está no direito à isonomia salarial, este sempre existiu, mas na imposição de medidas necessárias e objetivas a serem adotadas por todos os empregadores para a garantia desse direito às mulheres, as quais estão listadas em seu artigo 4º. Vejamos:

I – estabelecimento de mecanismos de transparência salarial e de critérios remuneratórios;

II – fiscalização contra a discriminação salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens;

III – disponibilização de canais específicos para denúncias de discriminação salarial;

IV – promoção e implementação de programas de diversidade e inclusão que abranjam a capacitação de gestores, de lideranças e de empregados a respeito do tema da equidade entre homens e mulheres, com aferição de resultados; e

V – fomento à capacitação e à formação de mulheres para o ingresso, a permanência e a ascensão no mercado de trabalho em igualdade de condições com os homens.

Obrigação extra é imposta às empresas com mais de 100 (cem) empregados, as quais terão que publicar semestralmente relatórios de transparência salarial e de critérios remuneratórios, respeitada as regas da LGPD, com informações que possibilitem a comparação objetiva de salários e ocupação de cargos de gestão entre mulheres e homens.

Caso assim não o façam, ficarão sujeitas a multa administrativa cujo valor corresponderá a até 3% da sua folha de salários, limitado a cem salários-mínimos e, conforme o parágrafo 2º do artigo 5º da Lei 14.611, constatada a desigualdade salarial ou de critérios remuneratórios elas deverão implementar plano de ação para mitigar a desigualdade, sendo garantida a participação dos Sindicatos e representante dos empregados nos locais de trabalho.

Deste modo, conclui-se que as consequências em não se observar a isonomia salarial, atualmente, estão expressas. Neste sentido, os parágrafos 6º e 7º acrescidos ao artigo 461 da CLT, determinam que na hipótese de discriminação o empregador ficará sujeito não só ao pagamento das diferenças salariais ao profissional discriminado, mas também: a possibilidade de pagamento de indenização por danos morais e a aplicação de multa igual a 10 vezes o valor do salário que seria devido, a qual poderá ser dobrada se reincidente.

Outrossim, não se pode deixar de mencionar que a Lei nº 14.611 dispõe que o Poder Executivo instituirá, futuramente, protocolo de fiscalização contra a discriminação salarial e de critérios remuneratórios. Espera-se, para a garantia da segurança jurídica, que este protocolo seja estabelecido em breve e que seja claro, objetivo não deixando dúvidas de como a Lei deve ser atendida pelas empresas.

Ocorre que enquanto não se tem o referido protocolo, certo é que a Lei está em vigor e que cabe aos empregadores a observar, razão pela qual devem avaliar internamente se há necessidade de ajustes em suas políticas de remuneração e quadro de carreira. Isto porque a não observância da isonomia salarial, a partir de agora, traz novas consequências que materializarão riscos judiciais e administrativos na esfera trabalhista.

Deste modo, é preciso que as empresas estejam organizadas e atentas ao cumprimento das novas regras e que acompanhem de perto a sua implementação.

Necessário frisar, ainda, que apesar de a Lei afirmar que dispõe sobre igualdade de salário entre homens e mulheres logo em seu artigo 1º, a verdade é que regula, ao longo de todo o seu texto, a promoção de um mercado de trabalho que fomente a igualdade não só de gênero, mas de raça, etnia, nacionalidade e idade.

Portanto, as empresas devem ficar vigilantes, pois o tema é importante, a sociedade e os órgãos fiscalizadores estão vigilantes, e é incrementado pelas discussões trazidas pelo pilar “S” (Social) da agenda ESG, na busca de um ambiente de trabalho seguro, saudável, integrado e que conte com colaboradores e parceiros plurais e capacitados.

Escritório Aliado: Bichara Advogados para Análise Editorial

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