Tributação na reforma trabalhista
Caio Taniguchi
Os reflexos da Lei nº 13.467/2017, que trata da reforma trabalhista, são inúmeros nas relações laborais e, em especial, no processamento das lides. Mas também houve grandes reflexos tributários introduzidos pela lei. A receita previdenciária é a mais gorda das fontes de receita da União, de modo que as receitas das contribuições sobre a folha, a CPRB, PIS, Cofins e CSLL correspondem a mais de 60% do total arrecadado. As contribuições sobre a folha estão entre as mais “suculentas” e, ao mesmo tempo, as de mais difícil interpretação sobre a base de cálculo.
Muitas alternativas de diversificação e desoneração de carga tributária foram criadas. O objetivo do auditor fiscal da Receita Federal previdenciária é a identificação de remuneração travestida. As Câmaras de previdência do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) transbordam de processos discutindo autuações milionárias. Dentro da legalidade e sem abusos, é possível estruturar um modelo remuneratório tributariamente eficiente. A Lei nº 13.467/2017 trouxe novas ferramentas úteis ao planejamento do modelo de remuneração da empresa, que podem gerar eficiência tributária.
O caso de diárias para viagem é um exemplo. O art. 28, §8º, “a”, da Lei nº 8.212/91, dispunha que integravam a base de incidência das contribuições previdenciárias “o total das diárias pagas, quando excedente a cinquenta por cento da remuneração mensal”. O §9º, “h”, do mesmo artigo, dispunha que não integravam a base de incidência “as diárias para viagens, desde que não excedam a 50% da remuneração mensal”. A Lei nº 13.467/17 alterou a redação do art. 28, §8º, “a”, e §9º, “h”, para afastar o limite de 50% da remuneração mensal do trabalhador como condição para que “as diárias para viagens” não integrem a base de incidência das contribuições previdenciárias. Contudo, é necessário possuir política interna escrita e manter documentação idônea em arquivo para demonstrar, em caso de questionamento da Receita Federal, que o valor das diárias pagas pela empresa decorre do deslocamento para a consecução das atividades da empresa e guarda razoabilidade com a natureza das despesas incorridas pelo trabalhador (não se prestando a substituir ou complementar a remuneração).
A Lei nº 13.467 ainda poderá sofrer alterações por MPs, especialmente em relação aos aspectos que impactam o recolhimento de tributos.
Vale ressaltar que a política de diárias para viagem não se confunde com política de reembolso de despesas. No entanto, a aplicação das duas políticas deve ser avaliada com cautela para evitar a configuração de remuneração disfarçada.
O caso de assistência médica também mudou. O art. 28, §9º, “q” da Lei nº 8.212/91, determinava que não integra a base de cálculo das contribuições previdenciárias “o valor relativo à assistência prestada por serviço médico ou odontológico (…), desde que a cobertura abranja a totalidade dos empregados e dirigentes da empresa”. A Lei nº 13.467/17 afastou a necessidade de que o benefício seja concedido a todos os empregados e dirigentes, fato que também refuta a interpretação da Receita Federal e da Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais no sentido de que tal extensão alcançaria a modalidade e a cobertura do benefício assistencial.
Dessa forma, a partir da entrada em vigor da norma, a não incidência das contribuições previdenciárias dependerá só da demonstração de que se trata a de “valor relativo à assistência prestada por serviço médico ou odontológico”. É importante ressaltar que a aplicação de critérios discriminatórios ou injustificados na concessão dos benefícios de natureza assistencial pode gerar reflexos de natureza trabalhista, especialmente no que tange a configuração do dano moral.
Os prêmios e abonos também merecem destaque. A Lei nº 13.467/17 incluiu a alínea “z” no art. 28, §9º, da Lei nº 8.212/91. Ficou determinado que não integram a base de cálculo das contribuições previdenciárias “os prêmios e os abonos”. Contudo, a legislação previdenciária não define o conceito de “prêmio” e “abono”. É necessário, portanto, buscar na legislação correlata e na jurisprudência elementos que ofereçam as diretrizes que devem ser seguidas pelos contribuintes.
Nesse sentido, relativamente ao “prêmio”, a Lei nº 13.467/17 inseriu o § 4º, no art. 457, da CLT, dispondo que “consideram-se prêmios as liberalidades concedidas pelo empregador em forma de bens, serviços ou valor em dinheiro a
empregado ou a grupo de empregados, em razão de desempenho superior ao ordinariamente esperado no exercício de suas atividades.”
No caso de a empresa possuir política de pagamento de prêmios, os quais até então são interpretados pela Receita como parcela sujeita ao recolhimento de contribuições previdenciárias e encargos trabalhistas, é importante pontuar que qualquer alteração deverá ser cuidadosamente estruturada, a fim de que não sobrevenham reflexos trabalhistas (vedação à redução do salário) e fiscais.
Neste cenário, a Lei nº 13.467/17 ainda poderá sofrer alterações por intermédio de Medidas Provisórias, especialmente em relação aos aspectos que impactam o recolhimento de tributos. Contudo, a verdade é a de que, até o presente momento, não há qualquer comunicado oficial nesse sentido. O mesmo vale para a possível interpretação restritiva do Fisco acerca das novas disposições legais que impactam o recolhimento das contribuições previdenciárias.
Thiago Taborda Simões e Caio Taniguchi são, respectivamente, professor de direito tributário da FGV e PUC-SP, sócio do Simões Advogados; sócio do Bichara Advogados
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