Por Henrique Loch Sbeghen
Que a internet veio para ficar, todos já sabemos. Contudo, acelerado pela pandemia, diversos segmentos e sistemáticas do cotidiano de todas as pessoas ao redor do globo foram inundados de novas práticas, estas, principalmente, digitais.
O mercado convencional e os meios comerciais sofreram uma abrupta alteração. Hoje, boa parte da produção, expansão, compartilhamento e transações são realizadas de maneira totalmente online. Sem dúvida, a rede é um ambiente inspirador capaz de proporcionar muitas criações. Porém, não podemos deixar de observar alguns pontos relevantes ligados às regras gerais da sociedade.
Com efeito, verifica-se que abastecido pelo “boom” da pandemia o e-commerce brasileiro obteve um crescimento acentuado de aproximadamente 73% no volume de transações no período (índice MCC-ENET¹), demonstrando que as pessoas começaram a aceitar e inserir em suas vidas, cada vez mais, o comércio eletrônico.
Porém, concomitantemente a este crescimento das demandas houve outro aumento, o da pirataria. A exploração indevida de marcas, obras e compartilhamento de tecnologias de uma gama elevada de produtos tornou-se algo “corriqueiro”. Mas, de tal forma, não pode ser tratado.
Diversos são os segmentos que têm a exploração indevida por terceiros, sendo que um destes segmentos requer grande atenção, pois perpassa pelos mais diferentes níveis e camadas, seja de uma linha de produção industrial, seja da sociedade como um todo, que é o software. Atualmente, todos nós temos algum tipo de interação com software em nossa rotina.
Com a virtualização do dia-a-dia, e a necessidade de programas de computador para o desenvolver de atividades do cotidiano, somado ao fato da falsa noção da ausência de responsabilidade quando disponibilizado em ambiente virtual acobertado pelo “anonimato”, acabou por tornar mais comum a propagação de produtos piratas².
Há de se fazer o alerta que, no setor digital, as cópias piratas não só desestimulam a evolução, bem como expandem a propagação de softwares com alta probabilidade de conter malwares, os quais podem infligir danos ao usuário final³, como facilitação de vulnerabilidades ou captura de senhas.
A título exemplificativo, o ataque de ransomware, que criptografa dados e cobra uma espécie de “resgate” para devolução do acesso aos mesmos, vem crescendo e prejudicando diversas empresas no Brasil4, principal País afetado na América Latina5.
O prejuízo estimado, não só com a pirataria, mas também com estes ataques cibernéticos é avaliado, mundialmente, em mais de US$ 300 bilhões6. Ademais, avalia-se que diferentes tipos empresariais perdem diversos ativos financeiros quando sofrem deste mal, sem contar os prejuízos operacionais que acarretam estes eventos7.
No Brasil a propriedade intelectual é garantida e protegida pela Constituição Federal, existindo diversos mecanismos jurídicos para que se efetive uma proteção aos direitos autorais e cesse a indevida exploração destas criações, em especial ao software.
Dentre elas, os artigos 102 e 103 da Lei 9.610/98, em leitura conjunta do artigo 2º da Lei do Software (Lei 9.609/98), dispõem sanções civis aplicáveis à reprodução ilegal elencando patamar de indenização pela exploração ilegal, sem esquecer o disposto no Código Civil.
Neste sentido, os tribunais brasileiros têm adotado uma postura rígida para combater a pirataria de software coibindo quem explora indevidamente a utilização de produtos piratas, com indenizações conforme parâmetros fixados nos precedentes do STJ8.
O entendimento adotado nos precedentes acima referidos possui um caráter punitivo-pedagógico, ao arbitrar condenação em valor correspondente a 10 vezes o valor da irregularidade dos softwares desprovidos de licença. Isto porque, se a condenação ficasse restrita ao valor do software, certamente seria um incentivo ao infrator, e consequentemente à pirataria, uma vez que apenas desembolsaria o investimento que deveria ter sido feito se um dia fossem descobertos.
Não se pode olvidar, outrossim, de que não cabe a responsabilização unicamente daquele que comercializa ou distribui softwares piratas, o usuário final que se utiliza de software fraudulento também pode ser responsabilizado, uma vez que tira proveito, auferindo ou não lucro, nos termos do art. 104 da Lei 9.610/98.
Resta claro, desta forma, que o Estado Brasileiro, atento aos prejuízos da sociedade em geral demonstra a preocupação na proteção à propriedade intelectual, bem como àquele que a tenha desenvolvido e tem seus produtos explorados indevidamente, dispondo de meios para a proteção do direito ofendido.
¹ http://mccenet.com.br
² https://noticias.portaldaindustria.com.br/noticias/competitividade/a ameaca-da-pirataria-no-comercio-online/
³ https://www.securityreport.com.br/colunas-blogs/o-impacto-de-um-ataque-cibernetico-a-infraestrutura-critica/#.YLqSGvlKjIU
4 https://www.securityreport.com.br/overview/brasil-e-o-nono-pais-que-mais-sofreu-ataques-de-ransomware-em-2020/#.YLpYH_lKjIU
5 https://canaltech.com.br/seguranca/brasil-e-o-pais-mais-atingido-por-ataques-de-ransomware-na-america-latina-173018/
6 https://7it.com.br/softwares-piratas-riscos-e-perigos-de-adquirir-de-ter-software-pirata-em-sua-empresa/
7 https://www.gazetadopovo.com.br/economia/ataques-ciberneticos-custam-mais-para-as-empresas-brasileiras/
8 Recurso Especial 1.122.687/RS, Recurso Especial 1.185.943/RS e Recurso Especial 1.136.676/RS
Fonte: Lippert Advogados