Apesar da defesa do teto de gastos, o anúncio feito ontem no Palácio da Alvorada, sem direito a perguntas dos jornalistas, apresentou mais um drible no dispositivo constitucional e ampliou os ruídos sobre os rumos da política econômica do governo, em especial a fiscal.
A ideia de destinar até 5% do Fundeb para o novo programa social retoma proposta que foi a público na discussão dos recursos para a educação. Ele não está sujeito ao limite constitucional de despesas e vai mais que dobrar de valor nos próximos anos. O pulo do gato pode estar na vinculação que foi estabelecida no Fundeb de parte ser destinada à primeira infância. Mesmo assim vai ser difícil convencer parlamentares que há pouco rechaçaram tal proposta.
A outra solução, e que tem maior impacto, é a ideia de limitar o pagamento de precatórios da União. A proposta significa uma espécie de moratória dessas dívidas decorrentes de decisão judicial. Na prática, o governo vai empurrar para frente, sem um prazo definido, despesas que não lhe agradam e que estão crescendo muito nos últimos anos.
Em tese, o governo abre um espaço fiscal de R$ 39 bilhões, se o valor de 2% da Receita Corrente Líquida (RCL) for aprovado e no ano que vem o gasto ficar limitado a R$ 16 bilhões. Mas esse espaço é, em realidade, uma dívida. Teremos assim, a dívida da dívida, já que o governo terá que colocar essa diferença de R$ 39 bilhões como um passivo em sua “dívida consolidada”, como bem lembra o economista Leonardo Ribeiro, especialista em contas públicas.
Para ele, a medida pode representar uma violação da Lei de Responsabilidade Fiscal. Ribeiro lembra que para criar uma despesa permanente, o governo precisa fazer uma redução também permanente de outras despesas. E no caso dos precatórios isso não estaria claro, em sua visão, e tem mais jeito de financiamento de gastos com dívida. “Isso gera um risco fiscal. E se o Judiciário não concordar com o acúmulo de dívida que isso vai gerar e mandar pagar?”
Sócio de escritório de mesmo nome, o advogado Luiz Gustavo Bichara diz que a ideia preocupa, já que honrar os precatórios decorre de compromisso constitucional. “Um governo que não paga as suas dívidas (especialmente aquelas decorrentes de decisões judiciais) não pode pretender inspirar confiança”, apontou. Os alertas estão dados.
Fonte: Bichara Advogados e Valor Econômico