O Novo Direito Comercial – Open Banking e seus impactos no Sistema Financeiro Brasileiro | Romano Donadel Advogados

Por Joao Victor Vieira Doreto e Júlia Botelho Xavier

Iniciamos a série de artigos sobre o Novo Direito Comercial Brasileiro apresentando o Open Banking, que chega ao Brasil com a promessa de revolucionar o Sistema Financeiro Nacional, visando possibilitar um crescimento, aprimoramento e aceleração de seus processos de transformação digital.

Em uma tradução literal, o termo Open Banking significa Banco Aberto e carrega consigo a ideia de possibilitar a troca de informações e dados entre instituições financeiras, instituições de pagamento e demais autorizadas a funcionar pelo Banco Central.

O Sistema Financeiro Aberto foi regulamentado pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) e o Banco Central do Brasil (BACEN) através da Resolução Conjunta BCB/CVM nº 1, sendo conceituado como o “compartilhamento padronizado de dados e serviços por meio de abertura e integração de sistemas”.

Regulamentação do Open Banking – o ingrediente de uma lenda ...
Fonte: Catarino Brasileiro, 2018

Open Banking, Sigilo e Proteção de Dados
Essa integração entre sistemas aumenta a autonomia ao consumidor, facilitando o trânsito de seus dados entre instituições informações, reduzindo a burocracia, tempo e até custos, sendo, porém, condicionada ao consentimento do titular de forma expressa, livre, informada, prévia, inequívoca, com finalidade, prazo de validade e objeto determinados, nos
termos da norma.

Os dados financeiros, de uma forma geral, sempre foram altamente protegidos pela legislação, a despeito temos a LC nº 105/2001, conhecida como a Lei do Sigilo Bancário, que trata sobre o sigilo das operações de instituições financeiras, definindo a proteção dos dados bancários e os casos específicos das possibilidades de quebra do sigilo.

Cumpre mencionar, também, que os requisitos à validade do consentimento apresentados na Resolução estão em perfeita consonância com as previsões de proteção aos dados pessoais conferida pela Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei 13.709/2018), promovendo maior independência do titular e conferindo-o real poder sobre seus próprios dados.

O Open Banking representa uma grande mudança na forma como utilizamos e tratamos dados ao colocar seu titular como peça central, com total controle sobre suas próprias informações, para possibilitar a implementação do sistema.

Com isso em vista, a Resolução estabelece normas de segurança para proteção desses dados, sendo imprescindível a adoção de medidas de governança e gestão de risco para recepção e armazenamento dos dados ou informações de clientes, sendo previsto o compartilhamento de forma estrita às hipóteses previstas.

Como funciona o Open Banking
A operacionalização desse sistema ocorre por meio da API (Application Programing Interfaces), que significa Interface de Programação de Aplicativos. A Seção V da Resolução especifica que essas interfaces dedicadas ao compartilhamento de dados e serviços devem seguir os padrões de desenho e layout, formato de troca de dados, controles de acesso, segurança, direitos e obrigações dos participantes, entre outros, mantendo o foco em API’s abertas à comunidade, visando a promoção da integração entre sistemas. Isso consubstancia a interoperabilidade, característica marcante do Open Banking, que significa a capacidade de comunicação transparente entre sistemas.

A utilização de API possibilita que diferentes sistemas conversem entrem si, sendo necessário apenas que os integrantes do Open Banking tenham uma API com conexão aberta para que outros agentes possam se integrar com ela.

Para facilitar o entendimento, Otávio Damaso, diretor de regulação do BACEN, exemplifica o funcionamento do Open Banking na hipótese de uma fintech ter acesso aos dados de um terceiro que possui conta em um banco X e, no momento que verificar que irá entrar no cheque especial, ofertar o crédito mais barato e cobrir o cheque especial daquela instituição financeira.

Participantes do Open Banking
Merece atenção a obrigatoriedade de compartilhamento de informações pelas instituições financeiras de grande porte (Segmentos S1 e S2) conceituadas pela Resolução 4.553/2017, tem o dever de compartilhamento das informações.

De acordo com o Relatório da Economia Brasileira do Banco Central, cinco grandes bancos detém a concentração de poder no mercado financeiro. Com a troca de dados entre as instituições, o que se espera é facilitar a entrada de novos players no mercado, com o aumento da competição, com a ampliação da oferta e qualidade de produtos e serviços financeiros, acelerando ainda mais o processo de desenvolvimento de fintechs, startups de base tecnológica que atuam no mercado financeiro.

Tem, ainda, a missão de promover cidadania financeira na medida que visa a e diversificação de opções, podendo atingir, inclusive, a população ainda desbancarizada no Brasil, o que estimula o desenvolvimento de educação financeira no país, uma vez que o aumento do acesso ao sistema financeiro, permite a conscientização da população através da compreensão de seus produtos, serviços, riscos e oportunidades.

Atualmente, 29% dos brasileiros são considerados desbancarizados, significando dizer que uma a cada três pessoas acima dos 16 anos no país sequer movimenta uma conta bancária há mais de seis meses, ou não possui nenhuma relação com qualquer banco, de acordo com a pesquisa realizada pelo Instituto Locomotiva. É possível inferir que essa parcela da população compõe a economia informal, o que é prejudicial para o crescimento econômico do país, principalmente em razão da impossibilidade de acesso ao crédito por esses cidadãos.

É parte da cidadania financeira, ainda, a participação do cidadão no debate sobre o sistema financeiro, razão pela qual o Bacen publicou o Edital de Consulta Pública 73/2019 em 28 de novembro de 2019, para receber sugestões e comentários, sobre a minuta das normas editadas a respeito do Open Banking.

Neste mesmo contexto da revolução do sistema financeiro em que se enquadra o Open Banking, ganha espaço também a iniciativa dos Pagamentos Instantâneos, chamado de PIX, abordada pelo Banco Central do Brasil no Comunicado nº 32.927/2018.

Atendendo ao que o nome diz, a norma estabelece um prazo máximo para realização do “switch”, que corresponde à transmissão de instrução de pagamento pelo BCB entre os Participantes do Serviço de Pagamento (PSP) e a infraestrutura de liquidação.

A conveniência do PIX se refere a disponibilidade do sistema em tempo integral, com uma rede de canais de acesso de fácil uso, melhorando a experiência do usuário, no mesmo sentido objetivado pelo Open Banking.

Implementação do Open Banking no Brasil
O Sistema Financeiro Aberto chegará será implementado no Brasil de forma gradual durante o período de 1 ano, sendo o início previsto para 30 de novembro de 2020, finalizando a implementação em outubro de 2021.

O Banco Central informou que o processo de implementação deverá seguir em 4 fases ao logo do ano, sendo:

Fase I: o público terá acesso a dados das instituições participantes do open banking no que diz respeito a canais de atendimento, serviços relacionados a contas de depósito à vista (corrente) ou poupança, contas de pagamento ou operações de crédito;
Fase II: dá início ao compartilhamento de informações de cadastro de clientes e representantes entre instituições participantes do sistema, bem como a dados de transações dos clientes acerca dos serviços mencionados na Fase I;
Fase III: compartilhamento do serviço de iniciação de transação de pagamento entre instituições participantes, bem como compartilhamento do serviço de encaminhamento de proposta de operação crédito entre instituições financeiras e correspondentes;
Fase IV: o open banking passa a incluir serviços como operações de câmbio, investimentos, seguros e previdência complementar aberta.”

Desafios e Oportunidades
Com essa regulamentação, o Brasil se junta a vários países que já aplicam o compartilhamento de dados dentro do sistema financeiro, como Estados Unidos, México, países integrantes da União Europeia, entre outros.

A criação do Sistema Financeiro Aberto abre uma nova era de serviços financeiros, deixando o caminho livre para o desenvolvimento de novas tecnologias para entrega de melhores produtos e clientes aos consumidores e, para além, escancara a necessidade do desenvolvimento de soluções focadas na segurança da informação, proteção de dados e prevenção.

Para o consumidor, de uma maneira geral, o Open Banking traz vantagens inigualáveis, além de abrir oportunidade para que grande parcela da população desbancarizada se integre, garante aos usuários maior autonomia e mais liberdade para controlar suas próprias informações e com isso buscar serviços em diferentes prestadores, diminui consideráveis custos às operações, de um lado por facilitar a troca de informações e de outro por gerar mais oportunidades para concorrência do mercado financeiro.

A despeito das várias vantagens do Open Banking, ainda existem diversos desafios à sua operacionalização, tanto pelas instituições participantes, quanto pelos consumidores, sendo que uma das principais é a necessidade do constante desenvolvimento de um ambiente com infraestrutura segura para a realização das operações.

O BCB mostra que, entre os vários benefícios, além de permitir a integração de serviços financeiros nas jornadas digitais dos clientes, o Open Banking também visa reduzir a assimetria de informação entre os provedores de serviços financeiros, o que é propício ao surgimento de novos modelos de negócios e Novo modelo de negócios. A forma de relacionamento entre instituições participantes, seus clientes e parceiros.

Entre os novos serviços que podem ser oferecidos, vale mencionar plataformas de comparação de produtos e serviços financeiros, assessoria financeira, gestão financeira, procedimentos mais amigáveis ​​para iniciações de pagamentos, entre outros.

Não há dúvidas de que o Sistema Financeiro Aberto proporcionará grande revolução no mercado financeiro brasileiro, possibilitando a criação de um ecossistema cada vez mais maduro e com efetiva participação dos consumidores, mas, em se tratando de operações com dados pessoais em tempos que dados são chamados de “o novo petróleo” é imperioso que permaneçamos vigilantes às instituições e regulamentações para que o desenvolvimento da iniciativa seja sempre saudável.

Referências
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OPEN BANKING É AGORA REGULAMENTADO NO BRASIL PELO BANCO CENTRAL. TozziniFreireAdvogados, 2020. Disponível em https://tozzinifreire.com.br/boletins/open-banking-e-agora-regulamentado-no-brasil-pelo-banco-central. Acesso em 02/06/2020;

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Um em cada três brasileiros não tem conta em banco, mostra pesquisa Locomotiva. Motiva & Estratégia, 2019. Disponível em <https://www.ilocomotiva.com.br/single-post/2019/09/24/Um-em-cada-tr%C3%AAs-brasileiros-n%C3%A3o-tem-conta-em-banco-mostra-pesquisa-Locomotiva>. Acesso em 05/06/2020.

Fonte: Romano Donadel Advogados