Por Christiana Fontenelle, Patrícia Mendanha Dias e Waneska Tagnin Overbeck
Não há quem atue na advocacia empresarial e não tenha ouvido a sigla “ESG” e sua vinculação às exigências do mercado, cada vez mais rígidas, de mudanças do paradigma corporativo que evidencie uma atuação empresarial pautada na adoção de rotinas positivas ambientais, sociais e de governança (ESG – environmental, social e corporate governance), tendo por objetivo final a obtenção de lucro norteada pela sustentabilidade e responsabilidade social.
Some-se a isso o fato de que, notadamente durante a pandemia e em decorrência das medidas de recuperação econômica planejadas pelos governos e pelas companhias, as práticas ESG passaram a fazer parte do portfólio de atuação de diversos comitês empresariais, bem como das assessorias no mercado de investimentos, das consultorias ambientais e de R&S (Recrutamento e Seleção). Neste contexto, a atuação jurídica tornou-se urgente e fundamental para operacionalização das diretrizes ESG e posicionamento positivo das companhias no mercado.
No que refere ao primeiro pilar, voltado para a prática ambiental (“E”, Environmental), o objetivo atual a ser alcançado é o de implementar medidas efetivas que garantam a completa regularidade ambiental, bem como que assegurem a operação sustentável das atividades potencialmente poluidoras, utilizando os recursos naturais estritamente necessários para sua consecução de forma responsável em toda a cadeia de consumo.
Para tanto, o foco da análise jurídica deve ser o mapeamento da cadeia produtiva de insumos, abrangendo a revisão de programas de compliance e a implementação de uma pauta ambiental positiva, voltada para identificação de certificações e índices que possam assegurar uma revisão do comportamento corporativo, estabelecendo estratégias para que as boas práticas sejam adotadas por todos os fornecedores.
Essas medidas não são simples e envolvem questões relacionadas às mudanças climáticas, restrição de recursos hídricos, gerenciamento de resíduos e pautas de biodiversidade, o que demanda uma avaliação 360º do aspecto jurídico ambiental. Assim, para que as práticas sejam efetivadas, é necessária uma completa interação entre as equipes das áreas jurídica, de sustentabilidade, relações institucionais, suprimentos e membros da administração, tais como diretorias, conselho de administração, conselho fiscal e respectivos comitês de assessoramento.
Isso porque, a ausência de normas que estabeleçam métricas objetivas com critérios e níveis de atendimento ao pilar ambiental do ESG dificulta sua operacionalização e, em diversos casos, resulta no greenwashing, ou seja, na divulgação da companhia como ambientalmente responsável, sem que, em verdade, sejam realizadas medidas efetivas para garantia da regularidade e transparência dos dados ambientais, o que tem sido objeto de diversos questionamentos pelo mercado investidor.
No que se refere ao segundo pilar, dedicado ao aspecto social do modelo ESG (“S”, Social), tem-se exigido a implementação de uma administração transparente e responsável, que promova a diversidade de sua força de trabalho, além da proteção, bem-estar, capacitação e retenção dos colaboradores, sem perder de vista a eficiência do processo produtivo.
Também sob este aspecto, a questão sanitária imposta pela crise da Covid-19 amplificou a discussão e o olhar para as rotinas relativas à segurança e saúde no ambiente do trabalho. Isto pode ser observado, inclusive, considerando uma realidade na qual houve a disseminação do trabalho em home office em que, agora, a necessidade de preservação da privacidade do empregado se confunde com deveres e obrigações de ambas as partes da relação de trabalho. Mais recentemente, também, outro debate enfrentado refere-se à possibilidade de o empregador impor a vacinação ao seu quadro de funcionários, o que poderia se sobrepor, por exemplo, à crença ou posicionamento político de determinados colaboradores.
Somado a todos esses fatores, há a urgente agenda da diversidade de gênero, raça e credo no mercado de trabalho que, apesar de não ser nova, ocupa lugar de cada vez maior destaque em importantes fóruns de discussão mundial, motivo pelo qual os investidores estão atentos ao assunto e a forma como as companhias vêm implementando as políticas ESG.
Tais exigências têm demandado que essas companhias estejam vigilantes e pro ativamente atuantes na busca de soluções confiáveis e duradouras que garantam a segurança e eficiência de seu processo produtivo, em um ambiente de trabalho saudável, integrado e que conte com colaboradores e parceiros plurais e capacitados, que se sintam engajados em manter uma relação de longo prazo.
Essas questões evidenciam que o mindset de investir na gestão responsável e sustentável de seu material humano e social, trará resultados positivos e de maior visibilidade para as companhias no mercado. Para atingir este propósito, entretanto, é necessário que se estabeleça um diálogo saudável e fluído entre diferentes áreas corporativas, com máxima atenção aos comandos legais vigentes e às orientações das autoridades fiscalizatórias.
Ao final, a devida operacionalização de todos esses aspectos “E” e “S” se consolida nas políticas efetivas de governança (“G”, Governance). Dessa forma, as companhias, com vistas a se adequar a essa tendência de mercado, vêm promovendo, de forma concisa, revisões, ajustes e correção de suas políticas, controles internos e atribuições dos órgãos de administração ou assessoramento, visando a observância contínua de boas práticas de governança corporativa, compliance e anticorrupção, integrando também as pautas ambientais e sociais.
Naturalmente que todas essas questões de governança podem impactar não só o viés social, comercial e empresarial, como também na reputação de uma companhia, razão pela qual a necessidade de revisão interna de políticas e parâmetros de regularidade é constante, exigindo suporte jurídico sensível e atento a este novo modelo empresarial, de forma a garantir que as decisões corporativas, tanto as mais simples, como as relacionadas às rotinas de operação, quanto àquelas voltadas à alocação de recursos e investimentos, sejam tomadas de forma consciente e com foco na pauta ESG.
O desafio é grande e demandará um envolvimento de todos os seguimentos empresariais de forma coordenada com o apoio e revisão jurídicos, mas o resultado certamente será o de companhias mais resilientes e prontas para o enfrentamento de crises e mudanças sociais.
Fonte: Bichara Advogados para Análise Advocacia