Por Luciana Gil Ferreira e Patrícia Mendanha Dias
Se tudo caminhar nessa toada, o ano será marcado pela regulamentação do
licenciamento ambiental no país
Não há como negar que, das várias polêmicas discussões de 2019, a pauta ambiental tenha sido uma das principais e de maior repercussão na imprensa nacional e internacional. Não por outro motivo, a promessa é de que o marco do licenciamento ambiental no país, objeto do Projeto de Lei 3.729 de 2004, venha a ser pautado na Câmara dos Deputados já nas primeiras semanas de fevereiro, sob relatoria do deputado Kim Kataguiri (DEM-SP) e em meio à disputa acirrada entre as bancadas ruralista e ambientalista.
Não se pode negar que realmente há necessidade de um marco seguro e consistente sobre o licenciamento no país. Até hoje está pendente lei federal que regule o procedimento, hoje regido apenas por norma infralegal – Resolução Conama no 237/97, que apesar das críticas, serviu e ainda direciona o procedimento pelo Brasil afora.
Se tudo caminhar nessa toada, o ano será marcado pela regulamentação do licenciamento ambiental no país
Atualmente, os Estados e municípios, que têm competência para legislar, adotam premissas e orientações diversas – existem mais de 20 mil normas espalhadas em todo o país – para regular o licenciamento sem uniformidade ou direcionamento comum, sendo muitas vezes de questionável legalidade e constitucionalidade.
As controvérsias do PL 3.729/04 envolvem, em sua maioria, a flexibilização do licenciamento, o que não significa enfraquecimento ou dispensa de obrigações, mas ações para desburocratizar e gerar maior eficiência nos processos, hoje tão morosos e complexos.
A primeira polêmica gira em torno da “Licença Ambiental por Adesão e
Compromisso”, uma modalidade de licenciamento autodeclaratório e sem prévia análise de impactos, em que o próprio empreendedor terá a responsabilidade de declarar as características de sua atividade, gerando uma espécie de licença “automática”, sem prejuízo da responsabilização por omissão ou apresentação de informação falsa. A proposta é que essa licença fique limitada aos empreendimentos de baixo impacto e risco ambiental, como já consta no substitutivo apresentado pelo deputado Kataguiri em julho de 2019.
Outro ponto que ainda gera muita discussão é delimitação, taxativa, dos
empreendimentos que deverão ser precedidos de licenciamento ambiental. No substitutivo apresentado por Kataguiri, foi proposto que os órgãos colegiados do Sisnama definam, para seu âmbito de atuação (federal, estadual ou municipal) as tipologias de atividades sujeitas ao licenciamento ambiental.
O objetivo é evitar que Estados e municípios tratem as atividades de forma
consistente, sem dispensas aleatórias e exigências discriminadas, como ocorre especialmente em âmbito municipal.
A problemática em se criar uma listagem é engessar de vez o que é – ou não – licenciável, não sendo possível prever de antemão todas as atividades existentes ou futuras, tampouco criar tipos abertos. Esse já foi um ponto de discussão no passado e o entendimento predominante sempre foi que o rol deve ser exemplificativo, exatamente por ser uma situação dinâmica e temporal.
Vale destacar que a definição de tipologia não se confunde com o procedimento do licenciamento em si. Inclusive, o ano já começou agitado, ainda em janeiro já foram publicadas diversas normas estaduais para regular o licenciamento ambiental (MG, RS, RJ e GO).
Para além disso, questão que tem sido muito discutida pelos representantes da bancada ruralista é a proposta de dispensa e/ou simplificação do licenciamento de atividades agropecuárias, o que já é objeto de ação judicial em alguns Estados. No substitutivo de Kataguiri a proposta é de que o Cadastro Ambiental Rural (CAR) seja considerado licença ambiental para as atividades como cultivos de espécies de interesse agrícola e pecuária extensiva. Ambientalistas defendem que a lei não pode ser aprovada com essa ressalva, já que é uma atividade com potencial prejuízo ao meio ambiente.
De um lado ou de outro, o que for aprovado para a lei não encerrará as discussões, o que, em certa medida, são salutares em um ambiente democrático. Importante evitar é que a controvérsia impeça a plena aplicação da norma, como ocorreu, por exemplo, com o Código Florestal (Lei Federal no 12.651/12). Apesar de julgado constitucional pelo STF ainda há milhares de ações esparsas que invadem o Judiciário e impedem e prejudicam sua plena execução, com posicionamentos diversos, em especial do Ministério Público.
A expectativa agora é que Kataguiri consolide as proposições e apresente um substitutivo que possa ser considerado o grande acordo do ano em matéria ambiental.
Apesar do PL 3.729/2004 ser o carro chefe, há outro Projeto de Lei (PLS 168/2018) que também reforça a necessidade de um marco para o licenciamento ambiental, ainda incipiente, com promessa de ser analisado pela análise na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) no próximo mês.
Se tudo caminhar nessa toada, o ano de 2020 definitivamente será marcado pela regulamentação do licenciamento ambiental no país, uma evolução significativa para toda sociedade e, sem dúvida, para o meio ambiente.
FONTES