Por Felipe Santa Cruz e Luiz Gustavo Bichara
Há décadas o Brasil discute a necessidade de uma reforma tributária. Há consenso de que nosso sistema tributário é caótico, e de que algo precisa mudar, mas o consenso termina aí.
Há mais de ano o Congresso Nacional discute a reforma tributária, por meio de duas Propostas de Emenda Constitucional (a 45, em trâmite na Câmara dos Deputados, e a 110, gestada no Senado Federal). Apesar de algumas diferenças relevantes, ambas visam à criação de um Imposto sobre o Valor Agregado (IVA), que seria o Imposto Sobre Bens e Serviços (IBS).
Embora as propostas não sejam imunes à crítica e mereçam algum aperfeiçoamento (o que é natural, eis que submetidas ao crivo parlamentar e ao debate com a sociedade civil, como é típico das democracias), é certo que a ideia da adoção de um IVA nos moldes do que se utiliza em quase todo o mundo é salutar. E, nesse sentido, o Parlamento está fazendo um sério debate com os diversos representantes dos agentes econômicos e da sociedade, trabalhando para mitigar controvérsias e fricções.
Nada obstante, o governo federal, que se esquivou de participar do debate durante todo esse período, agora anuncia com pompa e circunstância a sua reforma, que, infelizmente, se revela mero aumento de PIS/Cofins — sob o novo nome de CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços). É basicamente como o velho truque doméstico de mudar a cor da parede de casa e dizer que uma reforma foi feita. Um truque que terá seus efeitos nocivos para o setor de serviços ainda mais exacerbados neste dramático momento econômico que vivemos.
Para que se tenha uma ideia, o aumento para os contribuintes já submetidos à sistemática não cumulativa de PIS e Cofins será de 9,25% para 12%.
O governo federal tenta disfarçar os efeitos da elevação valendo-se de dois argumentos que não se sustentam. O primeiro é que o aumento seria neutro porque a CBS gera créditos. Ou seja, os insumos utilizados pelos contribuintes poderiam ser descontados na etapa subsequente. Mas, no caso dos prestadores de serviços, como é natural nessa atividade, quase não existem créditos a descontar, pois geralmente o principal insumo neste caso é o capital intelectual. E, para piorar, a folha de salários não gera crédito.
O segundo argumento para justificar a CBS se baseia na premissa de que esse aumento será sempre repassado pelas pessoas jurídicas até o consumidor final pessoa física. Novamente é um argumento que, conquanto teoricamente acertado, na prática enfrenta dificuldades. Ora, nem todo bem ou serviço contempla essa elasticidade de preço. Ademais, em muitos casos os contratos respectivos preveem que a tributação corre por conta do vendedor do bem ou do prestador de serviços. Então, a controvérsia sobre a CBS, muitas vezes, vai desembocar numa discussão contratual.
É certo que esses problemas poderiam se verificar também nas reformas endereçadas pelas PECs, mas dois fatores militam em favor delas: primeiro o longo prazo de transição entre os sistemas, que viabilizaria eventuais ajustes e uma mudança sem solavancos; segundo, o fato de que uma mudança global do sistema viria acompanhada de vantagens , como, por exemplo, a redução de custo tributário de determinados bens e serviços hoje excessivamente onerados — como telecomunicações, energia e combustível.
É má ideia priorizar um remendo, em vez de seguir na construção uma reforma tributária ampla, sem desprezar estados e municípios.
Fontes: O Globo e Bichara Advogados