Por Victória Tonin Carminati
Rege a execução o princípio de que esta deve se dar da forma menos gravosa ao devedor. Isso, contudo, não deve se sobrepor ao fato de que o processo é movido visando à satisfação dos interesses do credor.
Pensando assim e buscando trazer soluções para conferir maior celeridade e efetividade às ações executórias, em dezembro de 2019, fruto de um acordo entre o Conselho Nacional de Justiça, o Banco Central e a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, foi criado o sistema SisbaJud em substituição ao Bacenjud.
Desde que inaugurado, o Sisbajud – Sistema de Busca de Ativos do Poder Judiciário – se mostrou mais abrangente que o seu antecessor. A necessária renovação tecnológica da ferramenta levou ao desenvolvimento desse novo sistema, permitindo a inclusão de inéditas e relevantes funcionalidades anteriormente inviáveis em razão da defasada natureza da informática que originou o Bacenjud, como, por exemplo, o acesso às informações financeiras do executado.
A partir desse sistema mais moderno, em abril de 2021 foi implementada a chamada “teimosinha”. Não se trata de uma nova ferramenta de busca de ativos, mas sim de uma recente funcionalidade dentro do já conhecido sistema Sisbajud. Buscando garantir maior efetividade às tentativas de penhora, ela permite que a pesquisa seja realizada de forma reiterada pelo prazo de 30 dias, ou seja, durante esse período serão feitas diversas tentativas de bloqueio de valores nas contas do devedor, o que antes ocorria uma única vez e por apenas 24 horas.
Como o próprio nome já diz, o sistema “teima” na localização de ativos de forma persistente e reiterada, bloqueando valores até o limite determinado pela ordem de penhora judicial. Efetivado o bloqueio pela instituição financeira, ele é comunicado de forma imediata ao juiz que o determinou, o que anteriormente levava cerca de dois dias para ocorrer.
A reiteração ocorre de forma automática, bastando uma única determinação judicial de ordem de penhora online para que sejam realizadas repetidas tentativas de bloqueio nas contas do executado, evitando a necessidade de requisições suplementares e o pagamento adicional de custas pelo ato.
Dessa forma, reduzem-se as possibilidades de o executado obter êxito na ocultação de seu patrimônio, aumentando as chances de o exequente satisfazer seu crédito. Isso porque o instrumento permite a localização dos ativos com maiores chances de retorno, elevando o potencial de satisfação do crédito e, portanto, do cumprimento da ordem judicial.
Pelo CPF do devedor é possível localizar até mesmo criptomoedas caso investidas através de uma corretora, e uma vez encontradas, também são passíveis de bloqueio.
Em se tratando de devedor pessoa jurídica, o lançamento do CNPJ compreende apenas o número raiz, de modo que o bloqueio atingirá créditos tanto da empresa matriz, como de suas filiais.
Contudo, por se tratar de uma função bastante recente, é possível perceber que a sua aplicação tem ocorrido de forma diversificada entre os Estados, em razão da atual ausência de um regulamento específico sobre a sua utilização.
Até o momento, o Judiciário já se deparou com decisões que abarcam desde o indeferimento do pedido sob a justificativa de enquadramento como abuso de autoridade, como ocorrido no Rio Grande do Sul, ou ainda juízos que receiam a aplicação por desconhecerem a sua regulamentação, até julgados autorizando a aplicação da “teimosinha” de forma permanente e ilimitada nas contas bancárias do devedor até que haja a satisfação integral do crédito, como foi o caso do Estado de São Paulo no julgamento do Agravo de Instrumento no 2202768-46.2021.8.26.0000.
Certo é que essa inovadora implementação tem contribuído para que credores tenham maiores chances de satisfazer seu crédito de forma mais célere e efetiva, além de reduzir os prazos de tramitação dos processos, fortalecer a exequibilidade das decisões judiciais e ampliar a sua prestação jurisdicional.
No entanto, não se pode perder de vista que há, também, pontos negativos na sua utilização, em especial para aquele cuja conta bancária é alvo da medida.
Em desfavor de pessoas jurídicas, por exemplo, a utilização da penhora na modalidade reiterada pode representar até 100% do faturamento mensal da empresa, o que é vedado legalmente (CPC, art. 866), além de comprometer outras obrigações que têm preferência ao crédito perseguido, como as trabalhistas e as tributárias. Caberá à empresa demonstrar o excesso para restrição da medida ao patamar que não compromete o exercício de sua atividade.
Já para o devedor pessoa física, é possível que o bloqueio ocorra sobre recursos de natureza salarial, que a rigor não são passíveis de constrição (CPC, art. 833, IV). Ou, ainda, sobre poupança ou aplicações financeiras cujo valor depositado seja inferior a 40 salários mínimos, o que também é defeso, visto que é impenhorável. Em ambas as situações, caberá a ele indicar e demonstrar se a penhora recair sobre ativos dessas espécies.
De qualquer sorte, a ideia é que cada vez mais se possa contar com o auxílio de ferramentas tecnológicas capazes de automatizar os sistemas vinculados ao judiciário e, assim, eliminar gradativamente a formalidade e a rigidez das rotinas exigidas nos trâmites do processo judicial, simplificando-as e agilizando as demandas que visam atender aos interesses da sociedade.
Fonte: Lippert Advogados