A natureza mercantil dos planos de stock options | Coimbra, Chaves & Batista Advogados para ConJur

Por Luiza Porcaro P. da Costa

Não é novidade que a adoção de stock options como modelo de incentivo de longo prazo aos colaboradores tem sido cada vez mais utilizada no meio corporativo. Trata-se da outorga pela sociedade (nesse caso, a empresa empregadora) ao seu colaborador do direito de aquisição de ações daquela sociedade, por valor substancialmente inferior se comparado com o preço praticado pelo mercado, e sempre mediante o cumprimento de certas metas por tal colaborador — em poucas palavras, falamos de mais um mecanismo de remuneração variável.

As metas e as condições para o exercício da opção de compra costumam estar previstas nos stock option plans (planos de stock options) e nos documentos acessórios que os integram. Os planos apresentam, com maior clareza, o objetivo da sociedade em atrair, reter, motivar e bonificar seus colaboradores, a quantidade de stock options disponíveis para o exercício, a vigência do plano, o preço para aquisição das ações, os critérios de elegibilidade e performance, entre outros.

Se antes apenas as grandes empresas — a exemplo de Hering, Natura, Grupo Pão de Açúcar e Google Brasil — trabalhavam com stock options como uma forma de remuneração variável concedida aos colaboradores, hoje o modelo de stock options tem ganhado força junto às startups e empresas de médio porte, o que, por óbvio, chamou a atenção do legislador e do Judiciário. Explica-se: não há legislação específica sobre o tema e a Lei das Sociedades Anônimas é praticamente silente quanto ao assunto. Mais do que isso, passou-se a questionar, nos últimos anos, a natureza supostamente remuneratória (e não mercantil) dos stock options, o que ensejaria a incidência das contribuições trabalhistas e previdenciárias aplicáveis.

Por isso, a natureza dos planos de stock options é tema bastante discutido nos tribunais e, mesmo após anos, ainda é possível identificar posições antagônicas na jurisprudência. O Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf) havia firmado posicionamento no sentido de que os planos de stock options são mercantis na sua origem, mas, caso não sejam identificados elementos próprios dessa natureza (como a assunção de risco, a onerosidade e a voluntariedade da adesão ao plano), ter-se-ia então natureza remuneratória para fins tributários. O Tribunal Superior do Trabalho (TST), por sua vez, tem jurisprudência pacificada em sentido contrário: o plano de stock options tem caráter mercantil e, portanto, seus ganhos não podem estar sujeitos a um critério de remuneração salarial.

Foi nesse contexto que, recentemente, a discussão sobre a natureza dessas stock options voltou à tona: a 2ª Turma da 4ª Câmara da 2ª Seção do Conselho de Administração de Recursos do Carf entendeu, em sessão de julgamento realizada no último dia 12, no âmbito do Processo Administrativo nº 10880.734908/2018-43, que o plano de stock options de uma sociedade do ramo de energia possuía natureza mercantil para fins tributários e, portanto, não seria exigível do antigo executivo da sociedade, a quem fora outorgada a opção de compra de ações, o pagamento do Imposto de Renda de Pessoa Física (IRPF) que havia deixado de ser recolhido no momento de aquisição das ações.

Registra-se que a decisão pró-contribuinte foi tomada em atenção ao artigo 28 da Lei nº 13.988/2020 [1], devido ao empate entre os três representantes da Fazenda Nacional e os três representantes do contribuinte no julgamento – o que indica que a ausência de entendimento consolidado sobre o tema.

Se de um lado a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) defendeu a tese já sedimentada pelo poder público e buscou diferenciar as stock options mercantis das employee stock options — isso tudo para sustentar que a aquisição das ações constituiria parte variável do salário do executivo e, portanto, sujeita à tributação do IRPF —, o contribuinte, por outro lado, sustentou que a adesão ao stock option plan constituiu verdadeira oportunidade de investimento, e não parte integrante da sua remuneração, de modo que a única tributação aplicável seria o ganho de capital quando as ações por ele adquiridas fossem vendidas.

A emblemática decisão vai em desencontro com a posição recorrente trazida nas decisões proferidas pelo Carf e abre margem para que o assunto volte a ser objeto de recurso naquela instituição, permitindo ainda que seja aberta uma nova corrente de entendimento no Poder Judiciário sobre o tema.


[1] “Artigo 28 – A Lei nº 10.522, de 19 de julho de 2002 , passa a vigorar acrescida do seguinte artigo 19-E: “Artigo 19-E. Em caso de empate no julgamento do processo administrativo de determinação e exigência do crédito tributário, não se aplica o voto de qualidade a que se refere o §9º do artigo 25 do Decreto nº 70.235, de 6 de março de 1972 , resolvendo-se favoravelmente ao contribuinte”.

Fonte: Coimbra, Chaves & Batista Advogados para ConJur