Efeitos da recuperação judicial para os pequenos e micro credores | Tavares, Morgado, Furlan, Pires, Wahlbrink e Romani Advogados Associados

Por Ussiel Tavares da Silva Filho

O pedido de recuperação judicial formulado pela Odebrecht na data de ontem nos leva à necessidade de reflexão sobre um tema que entendemos que merece atenção do legislador.

Segundo amplamente divulgado, o passivo da Odebrecht é superior a R$ 90 bilhões, o que a torna o maior processo de recuperação judicial do país. Os motivos que levaram ao pedido de recuperação judicial são sabidos por todos e já estão sendo tratados nas esferas judiciais adequadas.

Em um processo envolvendo tão elevadas cifras, certamente os maiores credores são grandes empresas fornecedoras e instituições financeiras, credores estes que, pelo seu porte, são estruturados, com corpo técnico, especialmente contábil, financeiro e jurídico, suficientemente capacitados para atuar na defesa de seus interesses no processo de recuperação judicial.

Ocorre que, há uma grande fatia de credores nas recuperações judiciais que se tratam de pequenas empresas, na maioria das vezes familiares, geridas de forma quase que artesanal, que não possuem estrutura adequada para enfrentar as complexidades de um processo de recuperação judicial.

Segundo dados do Sebrae de 2018, 99% dos estabelecimentos empresariais no Brasil são micro e pequenas empresas, que juntas respondem por aproximadamente 52% dos empregos com carteira assinada no setor privado.

Apesar de ter representado grande avanço em relação à lei anterior, justamente porque houve uma grande flexibilização dos mecanismos para a busca de soluções de mercado destinadas à efetiva recuperação da empresa, especialmente pela possibilidade de ampla negociação entre a empresa em crise e seus credores, não há como negar que pequenos credores, na grande maioria das vezes sem estrutura técnica profissional, ficam praticamente alijados das decisões no processo de recuperação judicial, pois sequer chegam a participar do processo de recuperação judicial. São vozes não ouvidas na causa.

Tais credores sequer tem acesso aos editais de uma recuperação judicial e quando chegam a participar as assembleias de credores, sem qualquer assessoramento, não entendem o que está acontecendo.

Lembro-me de um caso recente de uma recuperação judicial de uma grande rede de supermercados em que um fornecedor de queijos produzidos artesanalmente em sua pequena propriedade rural, conduzida por sua família, viu seu negócio ruir, simplesmente porque a forma de tratamento dado aos seus créditos era exatamente a mesma dada aos grandes fornecedores daquela rede.

Ora, nossa Constituição garante a igualdade de tratamento, mas não há dúvidas que o tratamento “igualitário” dado aos credores de diferentes portes não traduz da melhor forma o ideal do aludido princípio constitucional.

Então, Senhores Legisladores, é preciso um olhar diferenciado para os pequenos e microempreendedores nas recuperações judiciais, já que esses negócios, além de representarem uma enorme fatia do empreendedorismo no Brasil, tem peculiaridades que evidenciam suas fragilidades para atuar em um processo complexo como é o de recuperação judicial.

Por favor, tratem os desiguais de forma desigual. Equiparar pequenos negócios a outros infinitamente maiores certamente não é a melhor maneira de concretizar o princípio constitucional da isonomia. Ao agir dessa forma, sob o pretexto de recuperar uma empresa e garantir sua continuidade, estaremos condenando outros tantos pequenos negócios à total inviabilidade.

FONTE