Sharenting comercial: a superexposição de crianças nas redes sociais | Lippert Advogados

Por Jonathan Vallonis Botelho

O termo sharenting é um neologismo que deriva da junção das palavras share (compartilhar) e parenting (parentalidade), surgido em 2012 no artigo do jornalista Steven Leckart publicado no Wall Street Jornal e popularizou-se como forma de designar o fenômeno do compartilhamento excessivo pelos pais da vida de seus filhos nas redes sociais. É um alerta da herança da cultura contemporânea sobre as pegadas digitais, ou seja, o rastro de dados com consequências futuras.

O isolamento social causado pela pandemia de Covid-19 como forma de combater a disseminação do vírus foi impulsionador do sharenting, já que muitas famílias utilizaram as redes sociais para compartilhar os rostos e hábitos de seus filhos desde o nascimento. A pesquisa de uma empresa global de segurança digital apontou que “33% dos pais brasileiros publicaram uma foto do filho menor de idade nas redes sociais sem a sua permissão e sem cobrir o rosto da criança antes de publicá-la” e apenas “24% admitiram ter consultado os seus filhos antes de publicar uma foto, mas sem apagar ou cobrir o rosto antes do compartilhamento”¹.

A prática ainda torna-se mais danosa e questionável no sharenting comercial, quando crianças são usadas ou expostas em vídeos, fotografadas e apropriadas por seus responsáveis legais com propósitos publicitários de fins econômicos para uma ‘negociação da intimidade’ em que recebem benefícios diretos ou indiretos, como a remuneração específica ou troca por produtos e serviços da empresa a qual estão fazendo a divulgação.

O artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal do Brasil prevê proteção aos direitos personalíssimos e que estão ligados à dignidade da pessoa humana; também o artigo 227 da Constituição garante prioridade de direitos básicos das crianças, adolescentes e jovens. A proteção da privacidade, que é um dos temas mais delicados na matéria dos direitos da personalidade, ainda está disposta no artigo 21 do Código Civil Brasileiro.

O Estatuto da Criança e do Adolescente traz proteção integral e a doutrina do princípio do melhor interesse do menor como limitação à autoridade parental, incluindo os direitos da imagem, privacidade e intimidade. Esta proteção também é estendida à garantia na internet, por meio das regras contidas no Marco Civil da Internet e na Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais.

As pegadas digitais com as informações fornecidas criam o perfil da criança no futuro, podendo surgir situações vexatórias com o surgimento de memes e possíveis reflexos em vagas de emprego ou concessão de crédito, porque um conjunto grande de informações estará à disposição. Salientando que no Brasil ainda haverá uma dificuldade maior de, na fase adulta, conseguir eliminar os dados disseminados, pois o Supremo Tribunal Federal concluiu que o direito ao esquecimento é incompatível com a Constituição Federal.

Por fim, a consciência sobre o sharenting comercial é relevante social e economicamente especialmente para as agências publicitárias e empresas que atuam no seguimento infantil, já que devem ter conhecimento sobre a legislação vigente, as restrições e o termo adequado de responsabilização e autorização dos pais para o uso de imagem, pois há risco de serem responsabilidades civilmente em caráter solidário e objetivo. Podendo, também, fornecedores e plataformas digitas sofrerem ações dos órgãos públicos competentes com base nos Instrumentos da Política Nacional das Relações de Consumo.

¹ Disponível em: https://press.avast.com/pt-br/covid-19-etiqueta-quando-se-trata-de-postar-fotos-de-criancas-nas-midias-sociais Acesso em: 10 fev. 2022.

Fonte: Lippert Advogados