Por Paulo César da Silva Filho e Rosiris Cerizze.
No dia 23 de outubro de 2018, a Receita Federal do Brasil (“RFB”) publicou a Solução de Consulta Interna COSIT nº. 13, através da qual manifestou o seu entendimento acerca dos procedimentos que devem ser observados internamente, para fins de cumprimento das decisões judiciais transitadas em julgado, que versem sobre a exclusão do ICMS da base de cálculo da contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins.
A Solução de Consulta em referência decorre de Consulta Interna formulada pela Coordenação-Geral de Contencioso Administrativo e Judicial (“COCAJ”), que visava esclarecer basicamente os seguintes aspectos:
(i) qual o montante de ICMS que se deve admitir a exclusão da base de cálculo da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins, isto é, se é o “valor do ICMS a recolher”, o “valor efetivamente pago”, ou o “total de ICMS destacado em nota fiscal”?;
(ii) na hipótese de se entender que a exclusão deve ser do valor do ICMS a recolher ou o do ICMS pago pelo sujeito passivo, como deve ser a segregação, em razão do tratamento tributário da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins?; e
(iii) como deve se proceder o levantamento dos valores do ICMS a serem objeto de exclusão da base de cálculo da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins, tanto para o futuro, quanto para o passado?
Com relação ao primeiro aspecto (montante do ICMS a ser excluído), a RFB colacionou na Solução de Consulta diversos trechos dos votos dos Ministros que participaram do julgamento do leading case (RE nº. 574.706/PR) no Supremo Tribunal Federal (“STF”), e concluiu que da análise de todos os votos formadores da tese vencedora se extrai que o ICMS que deve ser excluído da base de cálculo do PIS/Pasep e da Cofins, corresponde a parcela do ICMS a recolher para a Fazenda Pública dos Estados ou do Distrito Federal.
A manifestação desse entendimento por parte da RFB no atual estágio já era esperada, pois esse tema é objeto dos Embargos de Declaração que foram opostos pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (“PGFN”) nos autos do RE nº. 574.706/PR, os quais se encontram pendentes de julgamento.
Apesar de esperado, no nosso entendimento a posição da RFB é equivocada, pois a partir de vários outros trechos dos votos dos Ministros que participaram do julgamento, em especial do voto da Ministra Relatora Cármen Lucia, é possível se extrair o entendimento de que o ICMS que deve ser excluído é o ICMS destacado no documento fiscal, conforme se pode inferir por exemplo no trecho abaixo reproduzido:
“[…] Toda essa digressão sobre a forma de apuração do ICMS devido pelo contribuinte demonstra
que o regime da não cumulatividade impõe concluir, embora se tenha a escrituração da
parcela ainda a se compensar do ICMS, todo ele, não se inclui na definição de faturamento
aproveitado por este Supremo Tribunal Federal, pelo que não pode ele compor a base de
cálculo para fins de incidência do PIS e da COFINS. […]”
E a nosso ver o entendimento não pode ser outro, pois a base de cálculo da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins é a receita bruta, tal qual prevista no artigo 12 do Decreto-Lei nº.1.598/1977, e o ICMS que integra a receita bruta é o ICMS destacado que é aquele que incide e está incorporado no valor da operação ou da prestação de serviço, que em última instância corresponde a própria receita bruta.
No tocante ao segundo aspecto da consulta (segregação do ICMS, em razão do tratamento tributário dispensado em relação ao Pis/Pasep e a Cofins), a RFB esclareceu que a Instrução Normativa nº 1.009/2010, estabeleceu a codificação correspondente a cada regime tributário previsto na legislação das contribuições, definindo os Códigos de Situação Tributária (“CST”) aplicáveis para o PIS/Pasep (Tabela II) e para a Cofins (Tabela III), os quais devem ser considerados pelo contribuinte tanto na emissão de notas fiscais representativas da venda de bens e serviços, como na escrituração mensal das contribuições. Nesse sentido, a RFB conclui que a pessoa jurídica não apura e escritura uma única base de cálculo mensal somando as receitas auferidas no mês, mas sim, várias bases de cálculo para cada tipo de receita sujeita a cada tratamento tributário definido em lei (CST).
Seguindo esse raciocínio, a RFB sustenta que se a pessoa jurídica contribuinte do ICMS auferir receitas sujeitas a mais de um tipo de situação tributaria (CST) de PIS/Pasep e de Cofins, necessariamente ela deverá fazer a segregação e vinculação do ICMS à cada tipo de base de cálculo da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins, conforme o seu correspondente CST, ou seja o valor do ICMS correspondente a uma operação sujeita a alíquota zero de PIS/Pasep e Cofins (CST 06) por exemplo, não pode ser excluído da base de cálculo das contribuições
apuradas em relação as receitas decorrentes de uma operação sujeita ao PIS/Pasep e a Cofins na alíquota básica (CST 01).
Entretanto, como a RFB entende que o ICMS que deve ser excluído pelo contribuinte é o ICMS a recolher, a apuração do montante a ser excluído de cada base de cálculo de PIS/Pasep e da Cofins se torna uma tarefa significativamente complexa. Visando contornar esse problema a RFB sugere como solução, para apurar o valor do ICMS passível de exclusão, que o contribuinte faça uma decomposição do montante do ICMS apurado após o confronto dos débitos e créditos, para fins de apropriar a parcela do ICMS correspondente a cada base de cálculo das contribuições, conforme CST. Segundo a RFB a decomposição deve ser efetuada com base na relação percentual
existente entre a receita bruta sujeita ao ICMS, submetida a cada um dos tratamentos tributários (CST) de PIS/Pasep e de Cofins e a receita bruta total sujeita ao ICMS, auferidas em cada mês. Do valor consolidado mensal do ICMS a Recolher, segregado em função da receita bruta mensal e atribuído a cada CST de PIS/Pasep e Cofins, ter-se-á o correspondente valor do ICMS a excluir de cada base de cálculo mensal das referidas contribuições. Para melhor ilustrar o seu entendimento a RFB traz na Solução de Consulta o exemplo abaixo:
“A empresa auferiu no período receita bruta mensal de R$ 100.000,00, sendo 60% correspondente a vendas submetidas a alíquota básica da contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins (CST 01) e 40% correspondente a vendas submetidas a alíquota zero da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins (CST 06). Considerando que o valor do ICMS a Recolher corresponda a R$ 10.000,00, tem-se então:
(i) Valor do ICMS a Recolher apurado no período: R$ 10.000,00
(ii) Valor do ICMS a excluir na base de cálculo da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins
correspondente ao CST 01: R$ 6.000,00 (base de cálculo tributável de PIS/Pasep e Cofins)
(iii) Valor do ICMS a excluir na base de cálculo da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins
correspondente ao CST 06: R$ 4.000,00 (base de cálculo não tributável de PIS/Pasep e Cofins)
Em nosso entendimento, a segregação do ICMS em razão do tratamento tributário dispensado em relação ao PIS/Pasep e a Cofins é necessário, pois de fato não é razoável admitir que o ICMS incidente sobre uma operação isenta de PIS/Pasep e Cofins (CST 07) seja utilizado para reduzir a base de cálculo das contribuições decorrentes de operações sujeitas a alíquota básica (CST 01), e nessa linha, ressalvadas eventuais situações excepcionais, a nosso ver faz sentido a segregação da apuração do ICMS passível de exclusão, seja ele o pago, o a recolher ou o destacado, conforme o CST da operação, porquanto isso trará maior segurança e praticidade na apuração dos valores,
tanto para o fisco, quanto para o contribuinte.
Fonte: Cerizze Cunha Teixeira Advogados.